Josemir Camilo de Melo
P.H.D. em História
Tentando
imitar a técnica zen-budista da educação, que é lançar um Koan – uma questão
paradoxal, resolvi provocar alguns alunos com a seguinte proposta: (Até) Quando a
historia deixa de ser verdade (de fato[s]) e passa a ser construção? Minha
hipótese provisória é: até quando dura a existência da memoria humana (digo:
dos viventes/descendentes).
Quem
primeiro responde é um aluno de História da UEPB, Rafael Campos, um
grande leitor de teoria da história, talvez discípulo de José Carlos Reis. Ele
logo me retruca: Você está supondo o seguinte: que a
historia já foi em algum momento verdade, e que depois, passa a ser
"construção". Tento consertar meu raciocínio alegando que minha a
discussão é meio genérica e parte de uma notícia da polêmica entre Ginzburg e pós-modernos
a respeito de se o holocausto existiu ou não. Se ele foi (é) verdade? Parto do
princípio que não li a polêmica ou a crítica do nosso historiador Durval Muniz.
Por isto digo, de maneira genérica.
O aluno bota lenha na fogueira ao citar Collingwood,
de que este disse que a historia existe e é possível sabermos alguma verdade
(fatos) sobre ela, pois ela está na memória, portanto atemporal e objetiva,
mesmo sabendo que temos problemas com a memória.
Confesso que
tenho dificuldades em aceitar a ideia metafisica de “A História” (da
humanidade), “A História me absolverá”, “A História dirá que tenho razão...”
etc.. Essa ideia evolucionista como se todo o planeta e toda a ‘humanidade’
estivessem no mesmo patamar civilizatório. Outra palavrinha que descarto. O que
é A História para os pigmeus da África Central, para os Koisan (do filme Os
Deuses Devem estar loucos)? Faz 150 mil anos que eles estão aí, adaptados ao
seu mundo. Não têm História? Graças a Deus (com escusas aos ateus!). Mas,
voltemos.
A questão da
História e da Memória. Volto a perguntar: e a questão do massacre dos Armênios
pela Turquia? Caiu no esquecimento? Daqui a cem anos o holocausto dos judeus
sob Hitler cairá no esquecimento, sairá da História? Parece que enquanto houver
sobreviventes, certa memória falará da ‘verdade’ de um passado recente. No caso
dos judeus na Alemanha, monumentos também falarão sobre a atrocidade. Mas
quando o passado se tornar (ou é) remoto, qual o grau de veracidade dele? Outra
pergunta pode ser anexada a esta: por que esta ilusão de buscar a ‘verdade’?
Não seria a pessoa estar guindada pelo positivismo? Ou pelo Cristianismo?
Outro dia um
jornal me perguntou sobre o massacre da Praça da Bandeira. O que eu tinha a
dizer, já que não sou nem campinense, nem contemporâneo ao ‘fato’? Sugeri que o
jornal buscasse pessoas contemporâneas àquele evento. Para mim e para toda
geração posterior tal ‘fato’ se enquadraria em História, mas para os que lhe
foram contemporâneos, será memória. Enterrado o último sobrevivente de um
‘fato’, daí por diante é História, é dúvida, é versão, é reflexão, mesmo que
montada em Memória, é baixo grau de veracidade (?). O aluno então pergunta: só
a Memória é crível? Ela também pode ser falha, pode ser artificializada. A
crença é um discurso, uma forma discursiva de estar no mundo.
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