Deus:
Ilusão ou Realidade?
Jung
Mo Sung
Rafael Campos
O
título parece antecipar uma discussão de apologética cristã. Ilusão. A
realidade nesse caso, é que de cara Jung descarta de antemão a discussão dita “racional
e científica” a respeito de Deus (ou Deusa?, pergunta o autor).
De
tradição católica, Jung Mo Sung é teólogo e cientista da religião. Possui pós-doutorado,
é professor na Universidade Metodista de São Paulo e autor de vários livros.
Confesso minha admiração pelo seu jeito de fazer teologia: Desmond Tutu disse
que toda reflexão teológica que não comece pelo pobre é cínica, e é com esta
máxima, que percebo nos livros que li do Jung, que seu labor teológico se faz a
partir desta premissa. Para Jung, fazer teologia não é tagarelar sobre o ser
divino, a não ser que este se revele no próximo. E se isso acontece, é nessa
relação que temos de buscar sentido para existência. Deus revelou-Se em Jesus,
e este, no outro. A condição relacional do humano é que dá sentido à reflexão
teológica.
Na
obra, o autor parte da premissa, a qual em sua visão é fundamental, de que a discussão
dita racional e científica a respeito da existência de Deus é estéril.
Argumentos filosóficos sobre Deus são inférteis. Um deus que se permite provar
pela razão não é Deus, e sim uma construção mental, uma imagem elaborada. Jung
não segue a lógica dos autores sistemáticos, ou de obras deste cunho. Não quer
trazer à tona o que chamo de “conceitos rígidos” da filosofia para falar sobre
Deus. “Não-contradição, eternidade, tempo, causalidade, onipotência,
onisciência, onipresença”, são conceitos que passam longe da obra.
Com
isso, não quero que o leitor pense que o livro é raso. Pelo contrário. Ele flui
a partir do uso e abuso de outros conceitos os quais chamo de “mais líquidos”:
existência, relação, outro, alteridade (este aparece implicitamente e permeia
toda a obra), amor. Jung sustenta que nosso problema com Deus não se dá no
campo teórico, mas no campo da experiência/existência. A experiência modifica a
forma pela qual enxergamos o mundo. Deus não pode ser objeto de contenda
racional, pois só se pode dar-se a conhecer pela experiência. Portanto mesmo
não sabendo se Deus existe, ele sustenta que é possível experimentá-Lo na
relação com o próximo.
Embora
não queira “provar a existência” da divindade, faz questão de desconstruir as
imagens que considera serem tiranas sobre Deus. Em muitos casos, considera
plausível o ateísmo, pois este na verdade é uma descrença em falsas imagens do
divino perpassadas pela sociedade, família, censo comum, e até mesmo, pela
igreja institucionalizada.
Vejo
dois aspectos negativos na obra: o primeiro, em minha opinião, é que Jung faz
pouco caso das riquíssimas discussões filosóficas a respeito de Deus. Quem ler
apenas esta obra ficará com a impressão de que este tipo de literatura não é nem
um pouco importante na opinião do autor. Esse para mim é um ponto fraco, tendo
em vista grandes contribuições na história do pensamento que a reflexão
teológica/racional/apologética trouxe. O segundo é sobre o acabamento da
obra. Por ser uma brochura enxuta, de 98 páginas, o livro não possui orelhas, fato que denigre esteticamente qualquer livro. E as margens das páginas estão até o limite, o que dá a
enorme impressão de que a editora quis economizar na impressão e acabamento.
A
grande aposta que Jung nos convida a fazer é a da jornada histórico-existencial:
se Deus existe, ele é amor. O amor só pode ser experimentado, nunca provado/explicado
intelectualmente. Amor é um salto livre no escuro, de fé. Deus nos convida a
dar esse salto. “Aprendi que a experiência de Deus é uma experiência humana que
nos humaniza; e a experiência humana que nos humaniza é o experienciar Deus”
(p. 89).
Recomendadíssimo!
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