sexta-feira, 5 de junho de 2015

Resenha do livro: Deus: Ilusão ou Realidade?




Deus: Ilusão ou Realidade?
Jung Mo Sung


Rafael Campos


O título parece antecipar uma discussão de apologética cristã. Ilusão. A realidade nesse caso, é que de cara Jung descarta de antemão a discussão dita “racional e científica” a respeito de Deus (ou Deusa?, pergunta o autor). 
De tradição católica, Jung Mo Sung é teólogo e cientista da religião. Possui pós-doutorado, é professor na Universidade Metodista de São Paulo e autor de vários livros. Confesso minha admiração pelo seu jeito de fazer teologia: Desmond Tutu disse que toda reflexão teológica que não comece pelo pobre é cínica, e é com esta máxima, que percebo nos livros que li do Jung, que seu labor teológico se faz a partir desta premissa. Para Jung, fazer teologia não é tagarelar sobre o ser divino, a não ser que este se revele no próximo. E se isso acontece, é nessa relação que temos de buscar sentido para existência. Deus revelou-Se em Jesus, e este, no outro. A condição relacional do humano é que dá sentido à reflexão teológica.
Na obra, o autor parte da premissa, a qual em sua visão é fundamental, de que a discussão dita racional e científica a respeito da existência de Deus é estéril. Argumentos filosóficos sobre Deus são inférteis. Um deus que se permite provar pela razão não é Deus, e sim uma construção mental, uma imagem elaborada. Jung não segue a lógica dos autores sistemáticos, ou de obras deste cunho. Não quer trazer à tona o que chamo de “conceitos rígidos” da filosofia para falar sobre Deus. “Não-contradição, eternidade, tempo, causalidade, onipotência, onisciência, onipresença”, são conceitos que passam longe da obra. 
Com isso, não quero que o leitor pense que o livro é raso. Pelo contrário. Ele flui a partir do uso e abuso de outros conceitos os quais chamo de “mais líquidos”: existência, relação, outro, alteridade (este aparece implicitamente e permeia toda a obra), amor. Jung sustenta que nosso problema com Deus não se dá no campo teórico, mas no campo da experiência/existência. A experiência modifica a forma pela qual enxergamos o mundo. Deus não pode ser objeto de contenda racional, pois só se pode dar-se a conhecer pela experiência. Portanto mesmo não sabendo se Deus existe, ele sustenta que é possível experimentá-Lo na relação com o próximo.
Embora não queira “provar a existência” da divindade, faz questão de desconstruir as imagens que considera serem tiranas sobre Deus. Em muitos casos, considera plausível o ateísmo, pois este na verdade é uma descrença em falsas imagens do divino perpassadas pela sociedade, família, censo comum, e até mesmo, pela igreja institucionalizada. 
Vejo dois aspectos negativos na obra: o primeiro, em minha opinião, é que Jung faz pouco caso das riquíssimas discussões filosóficas a respeito de Deus. Quem ler apenas esta obra ficará com a impressão de que este tipo de literatura não é nem um pouco importante na opinião do autor. Esse para mim é um ponto fraco, tendo em vista grandes contribuições na história do pensamento que a reflexão teológica/racional/apologética trouxe. O segundo é sobre o acabamento da obra. Por ser uma brochura enxuta, de 98 páginas, o livro não possui orelhas, fato que denigre esteticamente qualquer livro. E as margens das páginas estão até o limite, o que dá a enorme impressão de que a editora quis economizar na impressão e acabamento.
A grande aposta que Jung nos convida a fazer é a da jornada histórico-existencial: se Deus existe, ele é amor. O amor só pode ser experimentado, nunca provado/explicado intelectualmente. Amor é um salto livre no escuro, de fé. Deus nos convida a dar esse salto. “Aprendi que a experiência de Deus é uma experiência humana que nos humaniza; e a experiência humana que nos humaniza é o experienciar Deus” (p. 89).
Recomendadíssimo!

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